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Blog literário criado em 29/08/2008, na cidade de Blumenau-SC.


3 de set. de 2008

O massacre

Já ouvi algumas vezes que a produção literária é cheia de surpresas, algumas boas, outras nem tanto, chegando até mesmo a serem dolorosas, ou doloridas. Recentemente me atrevi a transitar pelo mundo das crônicas. Algo sem pretensão, apenas para o deleite pessoal e alegria dos amigos, que tem me agraciado com inúmeros elogios. Na verdade não sei bem se estes elogios são pela qualidade do que é produzido, ou se é apenas um ato bondoso, afinal amigos são amigos. Acontece que acabei por me empolgar e, confesso que até me surpreendi com a quantidade de minha tão iniciante produção.

Minha inspiração somente me permite trilhar as veredas da crônica, mas mesmo assim procuro diversificar, com algumas tratando de assuntos mais sérios e outros indo para o lado mais cômico, deixando transparecer um pouco daquilo que eu chamaria de “o meu lado gaiato”. Talvez algum psicólogo se atreva a dizer que deixo transparecer minhas diferentes personalidades, mas não é nada disso. Trata-se apenas das diferentes faces da mesma pessoa. Toda esta introdução foi para esclarecer, e não justificar, que às vezes quando escrevemos podemos ser mau interpretados.

Como pretenso cronista tenho procurado me esmerar em retratar situações do cotidiano em que tomei parte, seja direta ou indiretamente, mas é a realidade retratada sob o meu ponto de vista, quer seja ele bonito ou não. Esta má interpretação dos fatos produzidos pelos autores acompanha a história da humanidade. Muitas são as histórias de intelectuais que foram perseguidos e tiveram sua obra censurada. A idade média ficou conhecida como a idade das trevas. No Brasil, mais recentemente tivemos da ditadura militar que perseguiu a muitos intelectuais. Não tenho a pretensão de me comparar a eles, apenas registro que agora, posso de forma mais clara, tentar entender o que eles passaram.

Já tive o amargo sabor de que com uma simples crônica desprovida de qualquer sentimento maléfico, despertar a ira de minha amada companheira. Lamentavelmente deixei-me entorpecer pelo doce prazer da criação literária e avancei alguns sinais. Em uma inocente crônica chamada “As meninas de saia curta”, cai em uma armadilha. Exercitando meus princípios de ser fiel ao máximo a minha criação, como tenho sido de uma fidelidade total a minha amada, derrapei e segui um viés literário que, confesso, avançou um pouco pelas fileiras de uma leve canalhice. Ao absorver toda energia gerada pela onda de reprovação que provoquei nela, lancinante dor percorreu o meu ser como a querer castrar minha tão iniciante carreira de pretenso cronista, tal foi à fúria do massacre a que fui submetido.

Procurei refugio entre os amigos, mas não fui feliz. Os homens se deleitaram com a leitura, mas suas enciumadas esposas não permitiram que os mesmos comigo fossem solidários. Não conseguia aceitar a idéia de ter causado tão terrível desconforto em quem tanto amo, e que só fez encher de alegria esta tão miserável vida. Para piorar, não foi um ato selvagem que cometi, mas apenas um atrevimento literário. Fiquei horas vagando entre a dor de ter maltratado minha amada, e a frustração de me sentir intelectualmente castrado. Estaria minha insignificante e debutante carreira fadada ao extermínio prematuro? Talvez sim, tamanha era a minha sensação de impotência diante de dantesco quadro. Terrivelmente amargurado e solitário, vagueei procurando a melhor forma de me redimir, se isto for possível.

No desespero vislumbrei a solução. Continuar a ser eu mesmo. Sim, eu mesmo, um eu com diversas faces, mas apenas um coração, um sentimento, um amor, mas com duas paixões. Uma paixão, se revelou tardia, pós quarenta anos, é a dedicação e a tentativa de ser reconhecido como cronista. A outra, me acompanha em uma longa e feliz vivência, que é algo em que já sou a muito reconhecido, que é o amor fiel e incondicional a minha amada. Agora, reconheço que fui infeliz quando me dediquei mais à paixão (literária) e não ao amor, mas tenho certeza de que foi apenas um deslize digno de um principiante, apenas isto.

Paulo Roberto Bornhofen
Escritor e Peota

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