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Blog literário criado em 29/08/2008, na cidade de Blumenau-SC.


2 de set. de 2008

A conquista

Dia desses uma colega, do mestrado, me enviou uma historinha que envolvia macacos, escadas e bananas, uma historinha bastante interessante, divertida e ao mesmo tempo profunda, o que me conduziu a fazer uma analogia com um alpinista naquilo que se refere à conquista e as quase conquista, que são na verdade fracassos, ou não, depende. Não que a pratica de desafiar as alturas alguma vez tenha despertado meu interesse, mas a aventura em si me fascina. Para escrever esse texto eu escolhi um alpinista específico, aquele que vislumbra uma bela e misteriosa montanha, cuja glória da conquista se torna um grande desafio passando-lhe a fazer companhia constante, em uma instigante e intrigante relação de atração e desejo, um verdadeiro jogo de conquista. Mas falta algo, a consciência do alpinista sobre a sua capacidade de conquista, a diferença entre o querer e o obter.

Ele sabe que a conquista da montanha, só se concretiza com o que é chamado – pelos iniciados – de ataque ao cume ou, ataque final ao cume. Porém quando o grande momento se aproxima, estando bem perto do clímax, da tão sonhada e desejada conquista ele se vê forçado a desistir e tem que retornar, o ataque final não vai se concretizar, a conquista não vai acontecer, nesse momento ele tomou consciência da sua incapacidade, pois a montanha estava além, transcendia ao seu desejo.
Tudo estava tão perto, já podia sentir o prazer que lhe aguardava. O momento que tinha fantasiado tantas vezes não se concretizou, pois ele foi forçado a parar, teve que recuar. Condicionantes que ele não controla serviram de impedimento. Enquanto contemplava a beleza de seus contornos e a maciez da neve que a revestia, tal qual um lindo tecido cobrindo um corpo feminino, e o desejo da conquista o absorvia cada vez mais, um lampejo de lucidez o trouxe de volta a realidade. “Acorda, não é pra ti! O que pensas seu atrevido?” Como a força de um trovão, essa mensagem lhe atingiu profundamente, e fez efeito.

Toda a preparação feita, todos os equipamentos de que dispõem, todo o caminho percorrido (que o levou tão perto), os desafios que teve que superar, dias e dias de estudos, de observação, os avanços, os recuos estratégicos, os precipícios que teve que vencer, os paredões inespugnáveis que suplantou, as negativas, nada disso tem valor, nada conta, o que vale é ataque final, mas esse, esse ele é incapaz de completar, não é para ele!

Alguns desavisados dirão: pobre alpinista deixou a montanha para outros, mais destemidos, que com certeza irão conquistá-la, pois ela assim o merece e assim há de ser. Para o nosso alpinista isso não interessa. Ele é experiente e sabe reconhecer a importância escondida por trás de uma não conquista. As questões não se resumem a esta simples dualidade entre conquista e não conquista, existe um algo mais, que se materializa e se manifesta somente entre ele e a montanha. Algo exclusivo, portanto inatingível para a tosca percepção do público, elevados a condição de meros espectadores.

Por outro lado permanece com nosso alpinista uma eterna fascinação, um constante desejo de ter algo que fisicamente e aos olhos estava e está tão perto, mas que a prática mostrou ser inatingível, inalcançável, o prazer proibido, representado pela frustração do fracasso em que se converteu o ataque final, que sequer foi tentado. Com sua experiência ele sabe que quando uma decisão pode trazer mais prejuízos que as glórias da vitória, é o momento em que se exige a grandiosidade da retirada estratégica. É neste momento que uma vitória de Pirro é perfeitamente dispensável e dever ser evitada a todo custo.

Ele sabe que algumas conquistas por mais fascinantes, misteriosas, belas e perigosas que possam ser, jamais deverão ser alcançadas. O que não tira delas o charme, o interesse, o fascínio, a sedução. Ao contrário, tudo isso é alimentado diariamente.

E, assim a vida continua seu curso normal, com alpinistas, montanhas e conquistas e as não conquistas, também. Lembrando sempre que se algum macaquinho desavisado tentar alcançar uma banana “proibida”, terá sempre uma turma de outros macaquinhos prontos a lhe aplicar uma calorosa surra. Vida complicada essa!

Paulo Roberto Bornhofen
Escritor e Peota
2006

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