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Blog literário criado em 29/08/2008, na cidade de Blumenau-SC.


31 de ago. de 2008

A Testemunha

Nós que moramos em cidades pequenas e médias do interior, ao mesmo tempo em que desfrutamos deste privilégio, também, sentimos muitas privações. Uma destas privações é mais fortemente sentida na grande ausência de bons espetáculos teatrais de nível nacional. Por isto, quando temos a sorte de sermos brindados com uma destas espetaculares performances de nossos idolatrados atores, as cidades entram em um processo que podemos classificar como sendo de verdadeira comoção cultural.
E foi isto que ocorreu. Blumenau e Itajaí tiverem o privilégio de acolher a peça “3 homens baixos”, que em seu elenco contava simplesmente com Francisco Cuoco, Gracindo Júnior e o impagável Chico Tenreiro. Comoção geral. Correria ao teatro para garantir o lugar e toda a preparação que um espetáculo desta magnitude merece. Para minha esposa e eu, tinha um sabor especial, pois iríamos conhecer o novíssimo teatro municipal de Itajaí. Chegamos um pouco antes e após deixar o carro sob os cuidados de um flanelinha, lamentavelmente atraímos com mais velocidade as agruras da cidade grande do que seus benefícios, mas tudo bem, em poucos passos já estava no saguão do teatro.

Uma maravilha, mulheres produzidissimas, outras nem tanto. Muitos homens tontos, tentando disfarçar enquanto corriam seus olhos sobre aquelas que mereciam e, acima de tudo em razão do risco de ser descoberto pela companheira e ainda evitando desperdiçar suas energias ignorando solenemente as menos brindadas pela natureza com os maravilhosos dotes físicos. Uma situação que diriam alguns era um verdadeiro “arraaaaaazo”, e no meio de tudo isto uma figura se destacou. Não, infelizmente não era nenhum dos protagonistas de nossa peça. Era uma daquelas senhoras que quando se veste combina nada com coisa nenhuma, que só pelo visual já poderíamos dizer, do alto de nossa majestosa discriminação, uma figura meio fora da casinha, ou como dizem os mais diretos, ele era doida mesmo, pois já estava falando sozinha. Isto era só começo.

Quando nos ajeitávamos em nossas cadeiras, tivemos nossa atenção desviada para um pequeno burburinho e adivinhem quem era o centro das atenções? Isto mesmo, ela, a nossa dama enlouquecida. Ela simplesmente sentará no lugar de outra pessoa e se recusava a sair. Nem os assistentes do teatro foram capazes de demovê-la, ou melhor, de removê-la. Minutos após apagam-se as luzes e começa o espetáculo, ou melhor, os espetáculos, pois havia um no palco, que havíamos pago para assistir, e havia outro no auditório, gratuito. Pensando bem, era um espetáculo, só. Acontece que nossa maluquinha era fã do Francisco Cuoco e interagia com ele, respondendo as falas do mesmo.

A situação estava mudando do cômico para o incômodo. Novamente entram em cena nossos queridos assistentes do teatro, que de forma exemplar retiraram nossa inquietante e já irritante madona sem juízo. Como todo grande espetáculo tem um “gran finale”, a nossa pretensa primeira-dama do Teatro Municipal de Itajaí tentou encenar o seu. Esboçou uma tímida reação, tentando talvez atrair a simpatia de um público que não era dela, e que já não achava mais a mínima graça, muito menos estava disposto a assistir um drama. Nossa desgraçada e infeliz aspirante a não sei o que, arrematou a atenção apenas das mãos daqueles que estavam encarregados de fazê-la abandonar seu ato, ou mais simplesmente, acabar com aquele triste incomodo, retirando-a do teatro.

E, em seu último suspiro para um público que insistia em lhe negar a atenção, ela então apelou para o seu ídolo maior e executou sua última fala: “isto é uma violência e você Francisco Cuoco é minha testemunha”. Após isto foi carregada, em êxtase, por calorosas mãos que a fizeram sumir atrás das cortinas, da porta de saída. Estava encerrado seu espetáculo. Com certeza na próxima peça, ela estará lá, pois o espetáculo tem que continuar.

Paulo Roberto Bornhofen
Escritor e Poeta
2005

1 comentários:

Nadir D'Onofrio disse...

Desta forma a deselegante senhora, teve seus minutos de fama... risos.
Concordo consigo, que residir em pequenas localidades, tem suas vantagens,
mas na verdade, carecemos das facilidades, existentes nas metrópoles.
Estou sentindo na pele, tudo isso.
Parabéns pelo espaço literário, meu agradecimento, por sua visita
em minha HP, dando boas vindas, ao amigo escritor e poeta, Alberto Afonso Landa Camargo.
Sucesso a você
Nadir
http://www.nadirdonofrio.com